Eu queria muito ver essa grade de conteúdo
TV Globo faz 60 anos e os mais atentos puderam ver uma aula de conteúdo durante mais de uma semana.
O brasileiro, aquele que não desiste nunca, encara muitas jornadas de trabalho em sua vida. Alguns, têm várias profissões. Aliás, tem duas delas que, inclusive, a cultura popular nos conta que todo cidadão portador de CPF desempenha. Uma, é técnico da seleção de futebol. Outra, crítico da TV Globo.
A julgar pelo que vimos na última segunda-feira, 28/04, no show que marcou os 60 anos da emissora, digamos que esta segunda tarefa ficou um pouco mais complicada de se desempenhar. Foi diferente, vai. Você se emocionou. Ou curtiu os memes, pelo menos.
O fato é que fazer 60 anos produzindo conteúdo garante um passaporte para todo tipo de roteiro e abordagem. E foi aqui que rolou o acerto, ou um dos principais deles: acertar a abordagem.
Foi sobre rir de si mesma, perceberam?
Não vou ficar aqui repetindo o óbvio que você já viu por aí em veículos de todos os tamanhos. Mas, para mim, e para o que vale aqui para este espaço, minha proposta é entendermos ou debatermos apenas, as duas grandes linhas narrativas mais evidentes.
A primeira, a efeméride em si. Não é pouca coisa, quase nenhum canal de TV no mundo pode falar que fez tanta coisa etc e tal. Então, estavam justificados os shows, as estrelas do esporte, os esquetes de humor , os textos meio grandiloquentes sobre a história das novelas, do jornalismo, do compromisso com os fatos. Estava justificado até mesmo não contar - como nunca fizeram - de seus viezes políticos sempre sentados ao lado da situação. Negócios, minha cara, negócios.
A segunda, foi a capacidade de rir de si mesma. Fizeram e muito bem feito uma grande chamada para o fio de conversa das redes sociais, capturando memes que a própria cultura digital já havia sequestrado de sua programação original. Isso ficou cristalizado no encontro das vilãs, digno de Saturday Night Live, que não poupou citações a sobrevida de suas interpretações ressignificadas pela remixagem da cultura das redes.
Tá, mas isso foi só a festa. E nem foi o melhor.
Para mim, o ponto alto em termos de construção de narrativa sequer foi esse momento culminante. Foi sobre COBERTURA.
Durante a semana que antecedeu a celebração TODA a programação, TODA a grade - um dos orgulhos do Boni aliás, que não vi ser citado -, respirou os 60 anos. Revisitou grandes momentos, claro, mas também mirou as lentes para a evolução tecnológica de sua técnica, do mundo como um todo, dos personagens que passaram por suas bancadas, das derrotas nossas enquanto país.
Para mim, esse foi o maior acerto. Até na TV do elevador de prédios de escritório você ouviu falar sobre isso, garanto. Isso, pessoal, é planejamento raiz. Para mim, o grande diferencial.
Queria muito ver esse mapa de conteúdo impresso em uma mesa de reunião.
Mas…sempre tem um “mas”.
A TV, assim como o Rádio, tem sua morte decretada há pelo menos 20 anos. O fato é que a audiência sincronizada e sem poder de escolha realmente faz pouco sentido nos tempos de hoje - para quem está chegando nos tempos de hoje agora, pelo menos.
E, então, sabíamos que para falar de futuro, o roteiro deste momento único deveria abordar o que vem por aí. E, nesse sentido, achei vago e auto-remissivo demais.
Falou sobre futuro com atrizes chegando aos 90 anos revivendo seus papeis de juventude. Falou de futuro com um Pedro Bial mostrando um telão de estúdio virtual - como os de L.A. - , mas sem abordar a expansão dos protocolos de TV Digital (a notícia sairia ontem, apenas), falou de futuro sem abordar o impacto das I.As generativas na indústria criativa, falou de futuro sem tocar na ferida da polarizaçào política.
E, então, para falar do que vem por aí nos próximos 60 anos, cantou sua música que já tem quase 50.
E, ao final daquele dia histórico, fui dormir com essa questão na cabeça: teremos futuro para a telinha, ou viveremos em eterno intervalo de expectativas?
Hoje não tem biscoitinho, mas um recado muito importante
Semana que vem tem news, calma. Mas vou começar a fazer algumas alterações sensíveis, não exatamente no que busco com este espaço, mas como localizo algumas reflexões em meu espaço proprietário.
Traduzindo: vou escrever mais no mauroamaral.com e focar na curadoria por aqui. Explico melhor semana que vem! Mas, fica o aviso, vamos abrir sempre com alguma remissão a este espaço e espero vocês por lá também para debatermos, ok?
Ate lá!
Perfeito! Também fiquei impressionando com a consistência da semana passada com um Cross over muito bem articulado entre assuntos, pessoas, histórias. E confesso que não tinha percebido essa visão incompleta de futuro. Talvez porque, como sujeito fruto da TV Globo, eu estivesse ali emocionado lidando com as minhas memórias afetivas que foram ativadas. Perdi esse senso crítico na segunda à noite.